Gesso (Manuel Bandeira)
Esta minha estatuazinha de gesso, quando nova
– O gesso muito branco, as linhas muito puras –
Mal sugeria imagem de vida
(Embora a figura chorasse).
Há muitos anos tenho-a comigo.
O tempo envelheceu-a, carcomeu-a, manchou-a de pátina
amarelo-suja.
Os meus olhos de tanto a olharem,
Impregnaram-na da minha humanidade irônica de tísico.
Um dia mão estúpida
Inadvertidamente a derrubou e partiu.
Então ajoelhei com raiva, recolhi aqueles tristes fragmentos,
Recompus a figurinha que chorava.
E o tempo sobre as feridas escureceu ainda mais o sujo
mordente de pátina...
Hoje esse gessozinho comercial
É tocante e vive, e me fez agora refletir
Que só é verdadeiramente vivo o que já sofreu.
***
Dedico este poema à nós que superamos nossas estórias de dificuldades. Elas ainda ecoam na minha cabeça e me dão a certeza de estar, de fato, "viva". Reconheço nossas estórias nesse poema talvez pelo fato dele ser justamente uma fábula sobre a superação do autor, que teve uma vida de perdas e construções tão avassaladoras quanto as nossas.
Bom guerreiros...felicidades à todos!!!
Rosangela
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