domingo, 29 de novembro de 2009

Conversa sobre Literatura.

Poema do Vazio

Tinha um oco em algum lugar
mais ou menos na altura do peito
Num corpo estreito e de paredes rudes
Meus olhos pontiagudos se moviam pelas curvas, esquinas
Neblina e vísceras
Acho que nunca mais voltei.

Bárbara.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Cropus herméticus


http://www.flickr.com/photos/pastore4life

Segunda feira, dia 23/11, após um caloroso debate sobre literatura envergada a poesia e uma conversa com o Odair, sobre termos direito ao que nos foi roubado, como uma simples olhada ao céu, ou mais grave, que reflete no impedimento de realizações e desejos, vontades e objetivos, sociais e pessoais, escrevi a poesia que acompanha o fim deste texto, mas antes tenho perguntas inquietantes, que faço a mim e hoje compartilho a vocês.
Como podemos até hoje estarmos restrito a termos, e o preconceito contra a palavra hemética?
O que entendo como hermetismo:
Hermes Trimegisto, deus do conhecimento sobre a palavra e o verbo - mistura de Hermes (Deus grego associado a Mercúrio em Roma- deus das correspondências, correspondente da sabedoria de Deus) e de Toth – (Deus pertencente ao panteão egípcio, deus da sabedoria, secretário e arquivista das sabedorias dos Duses)
Hermetismo, prática da sabedoria oculta, do auto conhecimento e do conhecimento sobre o universo, nosso entorno, no renascimento, com a escrita hermética se criou a magia hermética, forma de tentar desvendar o oculto.
Posso enxergar o que aconteceu, assim como várias palavras ao decorrer do tempo e as mudanças sociais, foram treinadas a carregar com sigo vícios e amarras, com o hermetismo não seria diferente.
É lógico que deixariam o hermetismo com uma carga pejorativa a nós, estudantes ou não, fazendo com que achemos que o que é difícil de se compreender não é pra gente – isso pode ser claramente visto nos jovens de hoje, que temem a leitura como o diabo foge da cruz, temos medo do difícil, pois pobre gosta de coisas simples. Poderia divagar sobre isto e com certeza chegaria em uma clara e até hoje visível, manipulação de classes onde o hermetismo fica restrito a uma determinada classe, guardada a sete chaves pelos professores de universidades e a quem, com eles pode conseguir ultrapassar esta barreira. Ou seja, qualquer um que esteja longe de ser um curandeiro de bairro ou que não tenha formação acadêmica, hermética. Isto reaparece hoje em dia, como foi sempre: de não termos direito de contemplarmos o céu em nossas poesias, à não podermos buscar alternativas para nossos problemas diários, permanecemos a eles e só temos o direito de restar a crítica pela crítica - reclamarmos, sem mira na solução. Padecemos em uma arte sintomática, não temos vozes além da reclamação, do que já esperam de nós. Não nos damos às nuvens que reflete nosso interno deis de sempre, deis da era primitiva, pois não é de se espantar que chegamos vivos até aqui, passamos na seleção natural. As pedras não se comunicam mais com as gentes, como disse Benjamim em “O narrador”, sem conselhos, andamos a deriva pelos tormentos da vida. Somos sintomáticos, e para nós é isso que basta, pois somos o que somos e só.
Proponho além de uma revisão da palavra hermética / hermético – que diz nossos vícios perante ao verbo. Proponho uma retomada do conhecimento, nós temos o conhecimento, o direito de sermos intelectuais, estudar e entender diversos assuntos e assim aos poucos deixarmos de ser manipulados pela cordialidade que impera além das escolas e universidades. Podemos assim romper o populismo que diz: ah eles não entenderiam isso, isso é demais para eles, o povo não entende estas coisas – frases que nos massacram diariamente e nos restringe a programação da mídia e quando não, quando nos vemos ‘livres”, nos damos a animações culturais que nos limitam ao aplauso. Podemos ir além, vamos contemplar o céu, podemos buscar nele as respostas, assim como num livro grande e difícil – hermético. Podemos livremente nos lançar a entender ou sem entender (pois duvido da certeza e verdade deste termo perante a arte) uma instalação dita hermética. Podemos ir além do provável - de que não entenderíamos tal coisa, e o de com a barriga vazia não temos tempo de olhar além. Assim cessaríamos boa parte de nossas derrotas, como não conseguirmos se espressar sobre nós em um grupo maior que seis pessoas, esta pode ser a prova de que não estamos orientados, não sabemos sobre nós mesmos. Sonho em acabar com falas de: ah eu não entendo de arte, ah eu não sei ler a todos, falar em público (sendo que nós temos memória viva graças a perpétua oralidade), minha arte é isso e pronto. Sonhe em acabar com isso e as nuvens contidas em minha poesia e refletidas em nós, podem falar sobre nós mesmos, pois elas não estão mais nos céus, além do céu da poesia? Ou estamos tão ocupados para velas? Como nossos problemas podem ser maior que o céu, ou fazemos ele ser maior que o céu?

Para ajudar nestas respostas, posso sugerir algumas leis herméticas:
Mentalismo - "O Todo é Mente; o Universo é mental."
Correspondência - "O que está em cima é como o que está em baixo. E o que está em baixo é como o que está em cima" – esta rompe a guerra de classes.
Vibração - "Nada está parado, tudo se move, tudo vibra". – nós podemos ser um exemplo disto.
Polaridade "Tudo é duplo, tudo tem dois pólos, tudo tem o seu oposto. O igual e o desigual são a mesma coisa. Os extremos se tocam. Todas as verdades são meias-verdades. Todos os paradoxos podem ser reconciliados" – rompe as verdades cientificistas, retoma o circular das coisas.
Ritmo -"Tudo tem fluxo e refluxo, tudo tem suas marés, tudo sobe e desce, o ritmo é a compensação".
Gênero - "O Gênero está em tudo: tudo tem seus princípios Masculino e Feminino, o gênero manifesta-se em todos os planos da criação".
Causa e Efeito - "Toda causa tem seu efeito, todo o efeito tem sua causa, existem muitos planos de causalidade mas nenhum escapa "

Não acredito em culpados além de nós, assim como não acho que as respostas que nos livram da culpa (o prometido perdão) estejam além de nós mesmos. No caso, as nuvens servem de espelho onde nos refletimos, nos enxergarmos em nós.
A poesia tem o poder de preencher o espírito mais do qualquer teoria até hoje dita como hermética:




a faca da caneta
gerando contexto
vim do ereto da arte
assunto além das cinzas
inexistente a morte
como um provérbio avô

pois tenho direito ao hermético das nuvens sim
fiz invisível sistema
me queriam cabresto
chão nas ruas
de meus problemas
mas fui além profecia




por :Bruno Pastore

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Difícil e prazeroso agregar as coisas



Difícil e prazeroso agregar as coisas.



É desta afirmação que vou partir para descrever minha experiência enquanto curadora da Mostra Andares Secretos.
Criar uma narrativa para descrever todo o trajeto, o percurso que atravessei, desde a carta aberta para convidar os artistas, que naquele momento significou exatamente: qualquer pessoa interessada, até as visitas dos artistas que recebi no Centro Cultural da Juventude, completos desconhecidos para mim em sua maioria, até hoje, quando vou até o Foyer dar uma espiadela na exposição, repor o pigmento em pó da instalação do Victor Sardenberg, ver se está tudo “ligado” e “acesso” para fazer o efeito que pretende.

Quem é o curador, o que é esta palavra carregada de significados?
Tirando as vestes daquilo que se entende por curador, e daquilo que eu entedia antes da experiência e daquilo que eu não entendia também, eu afirmo que na concepção que surge em meu corpo, curador é o artista agregador, aquele que se aproxima para conhecer e somente olhar e se afasta para trazer um novo respiro para aquilo que viu, recombinar com algo que supostamente não se encaixaria ali, costurar ferro em algodão, é juntar fotografias de Tadashi com pigmento de Victor e chumbo de Lucas.
É unir, além de tudo, é tornar possível, amalgamar tudo e ver no que vai dar, sem pretensões, sem aspirar algo além daquilo que vai surgir, é atingir o contentamento com aquilo que veio, sem juízo de valor algum, foi bom, ruim? O que conceitualmente você pensou? Nada importa, estou contente, o processo é que me instiga e não o resultado.
Este texto surge para dar voz ao processo, a como senti o que aconteceu, e por isso surge agora, “depois da chuva”.
Me lembro da exposição Intermembranaceo que aconteceu no CCJ no período de 02 a 30/08/2008, de como achei incrível a ocupação daquele espaço aparentemente esquecido. De como ganhou luz e força, das vezes que fugia para lá e ficava lendo os desenhos colados naquele parece lá no fundo perto da entrada dos camarins, do incômodo que formas que lembravam o corpo humano e suas secreções incomodavam alguns.
E a partir da oportunidade de escolher algo para organizar em novembro, não tive dúvidas de que eu adoraria ver surgir uma nova ocupação daquele espaço, e de como sinto falda da disseminação da linguagem pela qual as artes plásticas transmitem conhecimentos, afetos e sentimentos, por parte da programação do CCJ.
Eu não sabia sobre o que a exposição falava até o momento que a vi “pronta”, tinha desejos e idéias e vontade de transmiti-los, pensar em um tema, uma amarração, curadoria é isto, botar um monte de coisa num saco e amarrar...








Pensando em temas recorrentes na minha vida -porquenãodáparasepararvidaeartenemapau- cheguei na imagem de um apartamento, na segmentação da vida em cômodos, que me soam como incômodos na verdade, tudo separadinho um lugar para cada fazer da vida, comer na cozinha, dormir no quarto, pensei na cidade inteira, vendo os prédios pela janela da Heitor Penteado, vendo através do cinza, olhando com raio x, vendo as pessoas nos quadrados, a vida presa nisto, surgiu a palavra andares, antes surgiu apartamento, que nome! E a gente aceita numa boa, sonha com isto, queria alertar sobre isto, fazer um pouco de alarde com esta palavra, fazer sirene com ela.
Mas andares também era bom, porque vi os andares dos apartamentos e pensei nas pessoas andando dentro deles, vi seus paços aflitos vindo da rua e entrando neles, andando sempre no mesmo rastro do banheiro para o quarto, tirando a poeira com os pés.
Fiz um texto curto tentando sintetizar este pensamento e compartilhei com os artistas que me procuraram, alguns não entenderem e não entendem até hoje, alguns gostam e pedem que eu fale mais e uso ilustrações, algumas analogias abstratas da minha vida pra fazer compreender:

O Bruno que participa da mostra me perguntou e eu falei para ele:
Sabe quando já é tarde e você fica dentro do vagão do metrô sozinho?Andares Secretos fala um pouco sobre isto.
Mas como tudo é aberto a significação e a graça da Arte é esta, (graça de oferenda e as vezes de riso) a cada dia sinto que a mostra me fala algo, como o calendário do Seicho No Ie pregado na parede que viro a cada dia.
É bom estar no meio disto tudo, nas engrenagens, no ferver do pensamento do outro, na verve, ver os olhos brilhar, observar alguém escrevendo um texto, pregando um prego alí e não lá, e saber e sentir de alguma forma porque isto acontece, porque o alí é exatamente alí e não lá.
Ver pessoas jovens de fé, porque para fazer arte tem de ter muita fé mesmo, se movimentarem para longe de suas casas, com seus trabalhos embaixo do braço, dentro de sacolas de pano, almoçar yakisoba no chinês do largo do japonês, não ganhar dinheiro, nem pensar em ganhar dinheiro com isto, colar papelzinho na parede, se apaixonar pela minha Olivetti (máquina de escrever que faz muita coisa além de escrever) tanto quanto eu sou apaixonada por ela, me sentir viva e fazendo algo por/para/com outros que vibram na mesma força, que amam e detestam o cubo branco, ver as pessoas/público/artistas também, entrarem no cubo e esquecerem o que estavam pensando segundos atrás para pensar:
- o que este troço tem para me falar?

E no fim/começo/meio chegar da rua e ver as pegadas amarelas no chão e pensar: que bom!, suspirar a delícia do pensamento/lampejo que é saber que tem alguém olhando, e sonhar que esteja sentindo o que senti, que seu coração tenha batido num timbre diferente naquele momento, que tenha visto luzes e que algo tenha sido ensinado, sem forjar, sem forçar a barra, o contato com a “obra” basta.
Assim enxergo, assim me tornei, fui tornada feito uma torneira que jorra ou entornei-me ARTISTA. (tem de ser grande e em negrito porque se assim não for perde o sentido)


Entornar:

Inclinar (um vaso) para principiar a esvaziá-lo.
2. Derramar, verter.
3. Infrm. Beber.
4. Fig. Transtornar, deitar a perder.
v. intr.
5. Beber muito.
v. pron.
6. Derramar-se, verter-se.
7. Cair (uma vasilha) para o lado.
8. Gorar-se, perder-se (um negócio)